quinta-feira, 28 de março de 2013

UMA GUERRA INÚTIL E OS ROSTOS SIMBÓLICOS












                                             
                                                                                                                                                                                                     ____________________1_______________________2________________  

1 Crónica de uma das primeiras comissões na Guerra de Angola, escrita num estilo que empresta certo tom de atmosfera ficcional ao livro, embora tudo o que nele se narra, por vezes com força lírica, corresponda por inteiros a factos autênticos (excepto no que se refere a alguns nomes). De início até ao fim, regresso a Lisboa, ao entardecer, à medida que Luanda deixa de «existir» no horizonte.
2 Deriva por sonhos e rostos, falas e risos em contraste com certas nostalgias, viagens para perto, encontros, murmúrios e afectos.  Teresa ou Luísa, Cristina amanhã, todas elas simbolizam diferentes patamares sociais, ideias e comportamentos diferentes. O quotidiano dilui-se nessas percepções e diálogos, entre meses ou anos diferentes, rangendo por vezes alguma dor perante a sociedade decadente que tudo envolve.   
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segunda-feira, 25 de março de 2013

A VOZ DO CORPO OU A LÍRICA DO DESESPERO


Um pouco a história de uma mulher, nascida em África, de família branca, inquieta desde muito jovem, banhada pela força da baía que tocava a sua cidadezinha mas sobretudo votada a um desassossego que a ligava às artes, pintura, desenho, embora as suas cartas para as primeiras pessoas de quem se aproximou revelassem um devir de assombro e lírica. Assim procurou, em casa de família, estudar em Portugal, na província, tutelada pelos avós e acompanhada do irmão mais velho. Dois anos mais tarde volta a África, com o coração já partido, escolando como podia e procurando a libertação do corpo e do imaginário. Fugindo da norma, casando e sofrendo as primeiras grandes vicissitudes, foi recolhida pelos pais, foi  amada por eles, e a independência da nação, que também era sua, rasgou-lhe o horizonte de várias utopias, entre militares, cursos, um novo casamento, os filhos trasladados entre a sua bela casa e a casa dos avós, uma bicicleta, um lugar institucional, um atelier onde se isolava e recebia amigos mais ou menos imbecis e o sonho da dança e uma viagem à RDA onde verificou ter um mal de coluna e se apaixonou por um maestro de leste, num palácio que Brontë acharia bom para o seu romantismo. Ela também. Mas os ofícios do Governo eram claros quanto ao corte da bolsa e tudo se desmoronou em novos estudos em Lisboa, trocando os abraços e os abraçados, perdendo quase tudo, vivem uma profunda indigência, com álcool e decadência, longe de todos, recebendo uma ou outra amiga e o cão doente que logo a amou e viu as asas dos corvos, a casa despedaçada, o chá e alguma fatia de bolo, em todo o caso lúcida como nunca, assente num corpo alargado que tapou quase por completo a sua antiga beleza. Mas quando morre diz que tem a boca cheia de palavras e começa então a contar a verdade sobre a sua verdadeira vida.

domingo, 24 de março de 2013

A CASA DOS VELHOS OU A MORTE DO MUNDO

 
Este livro, A Casa, abre uma paisagem dolorosa de um imenso Centro de Acolhimento para a terceira idade, no qual, como no maior e mais velho paquete do mundo, centenas e centenas de passageiros se acumulam numa rotina patética. Todos esses velhos vivem como num lugar que lhes fornece quase tudo o que é preciso para uma vida normal, incluindo assistência médica, mas algo acontece para lá dos jardins, sobre os quais alguns hóspedes mais novos contam, após fugas malogradas, a impossibilidade de chegar ao fim, de encontrar alguém ou alguma estrada. O narrador daquela situação caracteriza pessoas, destinos, memórias da guerra, envelhecendo com os que vão ficando. Aquele mundo, onde até há uma biblioteca fabulosa, parece degradar-se com uma maior queda da demografia, entre mortes e suicídios. Tudo se resume, por fim, a meia dúzia de pessoas ensandecidas ou ao homem que tudo nos contou e se recolhe, sozinho, ao seu quarto, fitando o disco que segurava a lâmpada e onde ele julgava ver, em semelhança, o Mar da Tranquilidade, aspecto morfológico da lua.

EDITORAS CONTRA A PESQUISA DA NOVA ESCRITA

   
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1 Obra sobre a concepção de Deus na vida humana. Um antropólogo ou talvez cientista, eventualmente filósofo, faz-se acompanhar por um cicerone e visita locais como centros da terceira idade, hospitais, manicómios, universidades e colóquios, considerando tais lugares susceptíveis, pela dor e pelo pensamento, de lhe fornecerem sinais concretos de um Deus manifestado. Este homem procura descortinar em tais núcleos (onde a dor é manifesta) justamente algo que se lhe revele como presença de Deus, até agora insondável por vias de contacto em pesquisas assim. O livro coloca o problema do livre arbítrio.

 
2 A Escola Superior de Belas Artes, agora Faculdade da UL, é primeiro vista por um aluno nos piores anos antes da "reforma de 57" -- a decadência, o rigor irracional, as aulas sombrias. Numa segunda parte do livro, esse aluno aparece já como docente da mesma Escola, lutando pela claridade, pelo enterramento dos segredos conventuais ou manobras sigilosas, vivendo entretanto a paixão da mudança de regime, após o "25 de Abril", enquanto navega num mar de gente e de faladores, todos procurando instaurar a verdadeira reforma do ensino das artes ao nível superior, sempre perante a obtusa visão das coisas por parte dos novos governantes, cegos à cultura nesses termos mas conquistando um caminho plausível após uma longa viagem de assembleias e lutas contra o muro da política. Ele sai, enfim, sem que ninguém repare no facto.